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Por favor, crie

9/3/23

Eu tenho um amigo que conheci na época da escola que hoje em dia empreende e tem sua própria empresa. Eu acho ele um prodígio do empreendedorismo e tenho certeza que ele vai mudar drasticamente o curso do Brasil em alguma área nos próximos anos. Um dia eu tava conversando com esse meu amigo e perguntei pra ele o que motivava ele a fazer o que ele faz. A resposta dele me surpreendeu. Ele me disse que era apaixonado por criar serviços que possam ajudar minimamente a vida das pessoas. Ele falou que quer usar os conhecimentos dele em tecnologia para gerar inovações que melhorem a vida de todos. Eu achei lindo, de verdade. Logo depois disso, ele me devolveu a pergunta, e disse que para ele é muito difícil entender porque alguém faz arte. Ele ama arte, entende arte e consome muita arte, mas pessoalmente não conseguia se identificar com o desejo de produzir algo que não tivesse um objetivo prático primário. Eu fiquei sem resposta, porque também não sabia ao certo por em palavras o que me levava a criar coisas que a princípio não serviam de nada. Respondi algo do tipo “é algo inexplicável, só existe um fogo dentro de mim que faz querer produzir coisas pro mundo”. Mas eu sabia que aquilo era completamente impreciso. Faltava uma resposta para aquela pergunta.

Ontem eu terminei de ler a biografia do Steve Jobs, e achei a resposta que faltava. No final do livro (pare de ler se você não quer ter spoilers, se é que existe spoiler de biografia), o biógrafo deixa as últimas palavras para Jobs, e vem um longo texto dele discorrendo sobre vários assuntos da sua vida. Fui pego de surpresa por esse final e foi muito lindo. Em determinado momento, ele escreve: 

“O que me incentivava? Acho que a maioria das pessoas criativas quer manifestar o seu apreço por ser capaz de tirar partido do trabalho feito por outros antes. Não inventei a língua ou a matemática que uso. Preparo pouco da comida que como, e nenhuma das roupas que visto. Tudo que faço depende de outros membros da nossa espécie e dos ombros sobre os quais ficamos em pé. E muitos de nós querem dar uma contribuição para nossa espécie também e acrescentar alguma coisa ao fluxo.

Tem a ver com tentar expressar algo da única maneira que a maioria de nós é capaz de fazer - porque não somos capazes de escrever as canções de Bob Dylan, ou as peças de Tom Stoppard. Tentamos usar os talentos que temos para expressar nossos sentimentos profundos, para mostrar nosso apreço por todas as contribuições feitas antes de nós e para acrescentar algo ao fluxo. Foi isso que me motivou.

Lendo isso de novo agora eu me emociono e balanço a cabeça sem conseguir aceitar como alguém conseguiu ser tão preciso respondendo essa pergunta. É exatamente isso que eu sinto. 

Meu pai sempre foi completamente apaixonado por música. Loucamente apaixonado mesmo. Ele se emociona ouvindo Radiohead, fica nostálgico escutando Pink Floyd, exaltado quando toca U2, e raramente surpreso quando coloco algum artista contemporâneo de Hip-Hop pra tocar. Eu posso não ter herdado muitos traços físicos do meu pai (com excessão da calvície eminente), mas o que me assegura ser de fato filho dele é a paixão pela música. Eu sou louco por música, funciono completamente à base disso. Ouvir música é literalmente a primeira coisa que eu faço quando acordo e a última coisa que faço antes de dormir. Lembro de um dia chegar para o meu pai (que trabalha com T.I) e perguntar: “Como você se contenta em só ouvir música? Você também não sente uma vontade absurda, quase que uma obrigação de fazer parte disso? Produzir algo? Compor algo?”. A resposta dele foi simplesmente “não”. Pra ele é suficiente saborear um bom pedaço de arte. Eu preciso produzir. Eu preciso colocar minhas mãos nisso. Mas eu não tenho um pingo de conhecimento de teoria da música, produção ou composição. Esse meu desejo acaba transbordando por qualquer forma de escape disponível, isso é qualquer habilidade que eu domine no momento, seja por um vídeo, uma camiseta, ou um site. E talvez seja isso que diferencie os artistas dos apreciadores de arte. Essa sensibilidade para a arte não só como algo a ser consumido, mas também como algo de se desejar fazer parte.

Eu faço tudo isso que eu falei há muito tempo. Vídeos, camisetas, desenhos. Muito tempo mesmo. Se quiser ter certeza é só visitar a aba “fotos” aqui do lado. Eu faço isso há mais de 5 anos, mas sempre na escuridão. Sempre tive vontade, mas nunca tive coragem de expor minha arte. Eu não sei o que causou isso, se foi a forma como eu cresci ou o jeito que eu encaro o mundo, mas eu sei o que ajudou a curar isso. Não foi ser bombardeado de elogios e incentivos verbais de que eu deveria mostrar as coisas que eu faço para mais gente. Eu agradeço imensamente todo mundo que falou essas coisas e quis de fato me ajudar a vencer essa barreira, mas não foi isso que me fez vencer ela. Foi ver outras pessoas fazendo arte. Eu me lembro de entrar pela primeira vez no perfil da Acerca, marca autoral do artista Brunno Balco, no Instagram e ficar completamente deslumbrado. Fiquei deslumbrado com a comunicação visual, o nível de produção de conteúdo para produtos tão simples quanto um tapa-webcam de computador (ou melhor, um Dispositivo Anti-Espionagem Acerca®). Lembro ainda mais de quando recebi minha primeira compra da marca, um pin de lapela com um 🅰️ estampado. Não era uma camiseta com um grande logo e também não era uma peça de alfaiataria de alta costura e de qualidade absurda. Era um produto extremamente simples, mas que moveu montanhas dentro de mim. A personalidade naquilo tudo me tocou em lugares muito especiais. Fez me perguntar “por que caralhos eu não tô fazendo isso?”. Quando tive a oportunidade de conhecer o Brunno, a primeira coisa que fiz foi agradecer. Agradeci por ele ter lançado a visão dele pro mundo. Agradeci imensamente por ele não ter guardado tudo aquilo só pra ele. Agradeci ele simplesmente por ter feito arte.

Eu poderia passar o dia inteiro sentado escrevendo sobre álbuns de música, filmes, e marcas de roupas que eu entrei em contato e me causaram essa inquietação. O ponto que eu quero chegar é que para alguns, arte é contagiante. Ver arte faz querer fazer mais arte. Faz querer inserir a sua peça nesse quebra-cabeça gigantesco que é a vida. Então eu termino esse texto com um pedido. Se você se identificou com tudo isso que eu escrevi, eu te imploro, por favor, crie. Posta o texto que você escreveu e tá com vergonha de mostrar para os outros. Edita o vídeo que você gravou num pico de motivação e deixou pra trás uma semana depois. Cria o seu portfólio de fotografia e publica. Termina de produzir aquela música que tá guardada no FL Studio há 2 anos. Volta a desenhar como você desenhava quando era pequeno. Se você não consegue enxergar o valor de fazer isso pra sua vida, faça um esforço e tente enxergar o valor disso pra vida dos outros. Não tenho um pingo de dúvida que seja lá o que você for criar, vai tocar outras pessoas que também querem criar. Eu diria que é quase um dever social do artista expor sua arte. Como se fôssemos uma espécie em extinção que só pode contar com a ajuda de nós mesmos para continuar existindo.

Então, peço do fundo do meu coração: por favor, crie.